08 fevereiro, 2010

Alguém acredita nisto?...

Tenho uma amiga que insiste em dizer que um casal amigo nosso "nunca discute"! NUNCA! Nem uma divergência de opiniões, nem um amuo, nada! Segundo ela, eles são perfeitos e na sua vida a dois não há qualquer mácula!
A questão, a ser verdade até daria que pensar, mas, como não é nem chega a ser uma verdadeira questão. Eles dão-se bem? Sim, dão! Eles são a pessoa certa um do outro? Sim são! Esta é uma certeza que me acompanha desde que vi nascer esta história de amor... Eles nunca discutem ou divergem de opinião? Não creio!... Eles são chatos e monótonos? Não! Eles são seres humanos normais que se entendem às mil maravilhas, mas que não deixam de ser duas pessoas diferentes, com duas cabeças pensantes que vêm a vida cada um pelos seus olhos mas olham o futuro no mesmo sentido! Não é preciso haver baixarias e escândalos para se manifestar uma opinião diferente... Ter uma opinião diferente nem sequer é motivo de discórdia, porque viver a dois é isso mesmo: uma conjugação de duas cabeças...de dois corpos e de dois corações!
Um ser bicéfalo não é normal, é mitológico! Ou então é aberrante e devia estar num frasco!
Sempre desconfiei da perfeição, aliás fujo dela a 7 pés simplesmente porque não acredito que exista!
Então temos as relações normais, saudáveis mas cheias de imperfeições e depois há aqueles casais que nunca discutem.
Está sempre tudo bem, sempre tudo perfeito, tudo" certinho", gostam das mesmas coisas, têm os mesmos hobbies, os mesmos hábitos, as mesmas ideias, são tipo siameses. Entendem-se às mil maravilhas e nada lhes tira o ar imperturbável. E há quem ache que isto, sim, é o supra sumo do entendimento. Acham que têm uma relação perfeita porque nunca discutem, porque está sempre tudo bem, num entendimento tão harmonioso capaz de pôr em causa a paz de um monge budista.

Acho que isto não é perfeição! As relações não são menos harmoniosas e bem sucedidas porque de vez em quando as pessoas têm pontos de vista diferentes e os mostram e os defendem e argumentam. Porque de vez em quando há uma palavra ou gesto que foge à perfeição que quisemos construir e que nos faz perceber que o outro não é assim tão perfeito, e ainda bem.
Ainda bem porque mais cedo ou mais tarde vamos perceber que é dessa imperfeição e da consciência que ela existe, que nasce o entendimento, a aceitação das diferenças, as cedências, o espaço que todos precisamos dentro de uma relação e que só nos faz bem, a nós e à relação.

Porque acredito que só com pontos de vista diferentes, vontades diferentes, experiências de vida diferentes, hobbies diferentes e ainda assim tanto em comum (a mesma forma de olhar para a vida, sonhos partilhados, planos que se constroem de mão dada, com confiança e respeito), é que é possível crescer e aprender com o outro.

Se acho horrível aqueles casais que discutem em tudo quanto é lado, por tudo quando é assunto, gritam, berram, insultam-se e dão dois estalos nos filhos (alguém tem de pagar sempre pelo mau humor...), o radicalmente oposto também me faz confusão. Os mesmos hábitos, os silêncios que dizem mais que muito, a submissão a tudo e mais alguma coisa e no fim, vai-se a ver, e é tudo oco. Não há nada lá dentro. Simplesmente porque acreditam que é melhor assim, que discutir é coisa de gente sem nível (atenção, falo de conversar e discutir assuntos, não falo de insultos, berros, gritaria e "peixeirada") e que o bonito é manter sempre o mesmo tom, a mesma concordância, as mesmas perguntas de retórica e o mesmo nível de pseudo-diplomacia. Mesmo que isso implique que sejam infelizes, que tenham muito para dizer mas calam sempre, que sejam pessoas completamente apagadas e sem vida.

Tenho para mim que a existirem, haverá um dia em que estas pessoas acordam cansadas... uma da outra.

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